Coluna do CPDoc - Jornal Opinião - América Espírita – Ano XIV - Nº 150 – Março 2008
Espírita, formada em jornalismo, mestre e doutora em Comunicação Social, Magali desenvolveu sua pesquisa entrevistando livreiros, editores, historiadores e mergulhando por meses nos arquivos históricos de Salvador. Procura “compreender no que teria consistido o ideário espírita no Brasil, no século XIX, observando como se realizou uma tradução editorial e cultural, no mínimo curiosa”.
O trabalho mostra que Luiz Olímpio, embora oriundo de extratos médios da sociedade, como assistente de bibliotecário e autodidata tinha acesso a todas as obras que chegavam à Bahia. Capitão reformado da Guarda Nacional, bibliotecário, taquígrafo na Assembléia Legislativa, membro do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, jornalista e professor, entre 1866 e 1874, cuidou na Bahia da publicação e divulgação de vários textos espíritas e do primeiro periódico kardecista em língua portuguesa, o Echo de Além Túmulo, promovendo a introdução do espiritismo entre o público brasileiro. Figura singular, afirmava ser um missionário da espiritualidade, trazendo a nova mensagem da “Bahia para o resto do mundo”.
Após a publicação de artigos críticos ao espiritismo no Diário da Bahia, de autoria do A. Déchambre, traduzidos de um importante periódico francês, Luiz Olímpio “se envolve num empreendimento particular a favor da doutrina espírita, por meio da edição de vários escritos compilados à sua maneira”. Com isso, Salvador experimenta uma explosão espírita sem paralelo, com as obras de Kardec, lidas ainda em francês, discutidas apaixonadamente pelas classes cultas. Na Bahia do século XIX, escravagista, tendo o catolicismo como religião de Estado, as discussões sobre o espiritismo agitavam e repercutiam nos meios intelectuais.
L. Olímpio começa a atuar a favor do espiritismo em 1866, apesar de ter mantido um posicionamento católico. Assume o papel de editor intelectual das idéias kardecistas e traduz para o português vários textos da doutrina kardecista, em uma época que não existiam casas editoriais com linhas e catálogos definidos, somente tipografias que publicavam tanto as obras produzidas pelas autoridades católicas como um folheto espírita. Um empreendimento particular, sem auxílio financeiro de nenhum órgão ou pessoa.
Fundou na Bahia a Associação Espírita Brasileira e dela foi presidente honorário. Para popularizar o espiritismo, buscava interlocução com todas as classes sociais. Seus opositores tentavam, pejorativamente, classificar o espiritismo como “candomblé de brancos”. A primeira obra que lança, em 1866, com 1.000 exemplares (volume considerável para a época) era tradução cultural, não literal, da 13ª edição do Livro dos Espíritos e a compilação de obras kardecistas e espiritualistas, que se esgotou em poucos meses. A 2ª edição, ampliada, também se esgotou em poucos meses. Entre as duas edições é publicada uma Carta Pastoral do arcebispo da Bahia (1867), prevenindo os católicos contra os erros perniciosos do espiritismo.
L. Olímpio, na segunda edição, cita os intelectuais baianos que apoiavam a sua causa, buscando legitimar o seu ideário frente ao arcebispo e ao público. Outra obra contestando Olímpio é publicada por um militar, questionando a falta de respeito à autoridade da igreja. Logo em seguida, um folheto de outro padre é publicado, comparado o espiritismo ao protestantismo. Esses últimos documentos foram conseguidos e doados à Fundação Eduardo Monteiro pela pesquisadora. Depois dessa polêmica lança o Echo de Além Túmulo, em 1869 (a igreja também lança sua Crônica Religiosa, se opondo as novas idéias). Allan Kardec, na Revista Espírita, saúda a iniciativa da publicação deste periódico, mas não deixa de criticá-lo. A carta de Kardec foi publicada no Echo.
Inconformado com a pressão da Igreja e com a falta de apoio dos espíritas baianos, parte para o Rio de Janeiro em 1874, onde se mantém no anonimato e totalmente afastado das atividades espíritas. Antes, comunica que o editor francês Garnier (bastante importante e não espírita) já havia recebido comunicação para publicar todas as obras de Kardec em português. L. Olímpio dava como encerrada sua missão: a introdução do ideário espírita em nosso país.
Segundo Magali Fernandes, Olímpio pode ser visto como “um editor das vozes do céu, dos espíritos que, segundo ele, queriam anunciar a Terceira Revelação para a reforma do mundo”. Parte dos recursos auferidos com a venda de obras espíritas eram utilizados em campanhas para libertação dos escravos. Era um grande idealista que achava que seria possível unir o científico e o religioso. É sem dúvida o primeiro editor espírita, responsável pela tradução, organização, composição e inclusive o trabalho de distribuição de obras espíritas.
Ademar Arthur Chioro dos Reis Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. Médico sanitarista e professor universitário
2º vice-presidente da CEPA e membro do CPDoc