O que a ciência pode dizer sobre a crença na sobrevivência da personalidade após a morte? As evidências disponíveis negam ou confirmam essa crença, ou não levam a nada? Além da crença na sobrevivência on na extinção da personalidade com a morte corpórea, as evidências podem também dar subsídios a tomadas de posição racionais‘? Podem dizer algo sobre as expectativas da razão quanto aos perenes temas metafísicos do sentido da vida e da justiça? Essas questões de fundo não aparecem explicitamente, mas orientam transversalmente as discussões apresentadas no livro Science of Life After Death, em linha de lançamento para Julho deste ano pela editora Springer (MOREIRA-ALMEIDA, COSTA & COELHO, 2022).
O livro foi escrito por dois psiquiatras, Alexander Moreira-Almeida e Marianna Costa de Abreu Costa, que trataram da parte propriamente evidencial da tese, e por mim, que tratei das partes histórica e filosófica. Traba- lhamos em conjunto e revisamos mutuamente os textos uns dos outros, ao ponto de tornar a autoria de alguns capítulos difícil de definir para nós mesmos. Trata-se, portanto, de uma obra que expressa legitimamente o pensamento dos tres autores. Tematicamente, destacam-se três tipos de evidência (mediunidade, memórias de vidas passadas e experiûncias de quase morte) e um tipo de crítica ăs evidências (negacionismo). A tese central do livro é a de que esses quatro fatores estão em relação dialótica e dinămica, sendo impossível dissociar as evidências disponíveis da contraevidência ou “proibição a priori” de toda e qualquer evidência em geral. Isso porque o grau de plausibilidade dos três grandes grupos de evidências disponíveis, de acordo com nossa análise, não pode ser racionalmente justificado como baixo. Tampouco há tratados e estudos que mostrem ou argumentem suficienteniente contra as evidências. Contudo, os três grupos de evidência são culturalmente tidos como pouco plausíveis, ou mesmo peremptoriamente assumidos como implausíveis apesar de. qualquer evidência disponlvel.
Como expus pormenorizadamente no texto Três conceitos da experiência: o crílico-transcedental, analítico-pragmático, e o espírita(COELHO, 2022), a natureza intersubjetiva da sociologia do conhecimento vem descobrindo o que a filosofia geral estabelecera com grande segurança> desde G. W. F. Hegel,a saber, que a natureza do conhecimonto não permite o purismo almejado pelos positivistas e outros tipos de realistas dogmáticos,sendo fortemente dependente do valores, concepções e visõesde mundo só compreensíveis intersubjetivamente. Com basen essa constatação filosófica, meus colegas reuniram casos exemplares de cada um dos tres grandes tipos de evidência em favor da sobrevivência da personalidade humana, constatando não apenas que há evidëncias fortemente sugestivas de um fenômeno não explicável sem a hipótese da sobrevivência do espírito como também que o conjunto das evidências as torna ainda mais persuasi- vas do que os casos particulares. Em outras palavras, o fato de termos evidência forte para visões e comunicações com pessoas já falecidas,somado às evidências muito fortes de consciência em estados de coma e parada cardíaca nas experiências de quase morte, somado ao fato do que certas memórias de vidas passada tambem oferecem forte evidencia do que a mesma personalidade habita diferentes corpos. compõem um quadro de evidências onde as explicações contrárias à ideia de sobrevivência da personalidade se tornam muito menos plausíveis. Enquanto a hipótese da sobrevivëncia explica os diversos tipos de evidência, as hipóteses contrárias—fundamentalmente motivadas pela visão de mundo materialista — têm de aventar explicações para não apenas uma, mas várias formas distintas de evidência. Esta última empreitada, contudo, não tem sido bem-sucedida, e as explicações de tipo materialista que pretendem invalidar as evidências disponíveis são, muitas vezes, gritantemente negacionistas, dogmáticas e reducionistas.
Esperamos, sobretudo, que esse livro possa instigar novos textos de natureza semelhante, ou sobre abordagens mais históricas, culturais e filosóficas sobre as causas e origens desses obstáculos a uma apreciação racional das evidëncias disponíveis.
REFERÊNCIAS
COELHO, H. S. 2022. “Tres conceitos de experiência: o crítico-transcendental, o analítico-pragmătico, e o espírita”. Apresentado no 16o ENLIHPE. No prelo.São Paulo: CCDPE.
MOREIRA-ALMEIDA, A., COSTA, M. A. and COELHO, H. S. 2022. Science of Life After Death.. Cham, Switzerland: Springer.Link for the flyer: https://link.springer.cont/book/9783031060571.
* Matéria publicada em 22 de maio/2022 no Jornal de Estudos Espíritas
Humberto Schubert Coelho
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