O Espiritualismo Moderno chegou à França em 1852 e logo fez seus primeiros adeptos. Mais tarde, quando Kardec promove uma intensa mudança de método e de paradigma no espiritualismo francês, o adjetivo espírita passa, a partir dos anos 1860, a designar também os espiritualistas. Surge, então, o conceito de escolas americana e francesa do Espiritismo.
Na edição de abril de 1864 da Revista Espírita, Kardec admite a existência das duas escolas, porém atribui ao seu trabalho a categoria de início do espiritismo filosófico: "o Espiritismo experimental estava sobre seu terreno na América, ao passo que a parte teórica e filosófica achava na Europa os elementos mais propícios ao seu desenvolvimento; também foi ali que ela nasceu: em poucos anos conquistou o primeiro lugar. (...) A América, pois, foi o berço do Espiritismo, mas foi na Europa que ele cresceu e fez suas humanidades."
Embora tenha admitido seu desenvolvimento científico e o alcance e a justeza de muitas de suas ideias, parece que Kardec não considerou a experiência americana digna do epíteto de "filosófica” devido à ausência de uma coordenação metódica de princípios: “Não existe, a bem dizer, corpo metódico de doutrina; ali se encontram, como se pode ser convencido, ideias muito justas e de alto alcance, mas sem ligação.” ( Revista Espírita, abril de 1869).
A afirmação de que não havia no movimento espiritualista “corpo metódico de doutrina” não é precisa, pois este movimento tinha um corpo de princípios fundamentais. Ainda assim, este equívoco de Kardec é compreensível, pois os aspectos teológico e filosófico ficavam em segundo plano nas ações de divulgação, que contava constantemente com médiuns de efeitos físicos como divulgadores e missionários. Isso fez com que os europeus desenvolvessem uma ideia míope sobre a natureza do movimento espiritualista americano. Contudo, Kardec acerta quando fala na existência de ideias “sem ligação”, pois como não havia uma liderança que cuidava da função de coordenação principiológica, os espiritualistas formaram, neste período, grupos com interpretações distintas quanto aos aspectos secundários. Somente após 1870, as obras da espiritualista Emma Hardinge-Britten ganharam ampla popularidade e passaram a ser vistas como uma referência doutrinária.
A formação do corpo doutrinário e filosófico do Espiritualismo Moderno ocorreu, nos Estados Unidos, durante os primeiros três anos de existência do movimento, quando foram fundados os primeiros periódicos de divulgação e realizadas conferências regionais, com o propósito de discutir os princípios comuns adotados pelos adeptos. Quando, finalmente, adquiriu um corpo teórico e doutrinário consistente, que abrangia aspectos relacionados à ciência e à religião, despertou animosidades, ao mesmo tempo, entre alguns cientistas e líderes religiosos que não concordavam com as interpretações dos espiritualistas.
A ampla divulgação do Espiritualismo Moderno através da alegação de fenômenos observáveis lhe garantiu a possibilidade de desenvolver um método empírico de pesquisa, chamando a atenção de vários homens de ciência da época. Esse aspecto científico se tornaria uma das características mais fortes do Espiritualismo Moderno, tornando constante a adesão de cientistas aos seus postulados ao longo da história desse movimento. De acordo com R. Laurence Moore, no livroSpiritualism and Science: Reflections on the First Decade of the Spirit Rappings nesse potencial científico, houve a preocupação epistemológica dedesenvolver um corpo teórico, distinto de qualquer aparência de misticismo: “O Espiritualismo, nos anos 1850, tornou-se um movimento autoconsciente precisamente por distanciar-se de qualquer tradição ocultista e apelar, não à iluminação interior da experiência mística, mas ao observável e aos objetos verificáveis da ciência empírica.”
Uma parte significativa dos primeiros espiritualistas era oriunda do cristianismo protestante, assim os princípios da nova doutrina passam a ser vistos como orientadores para uma evolução teológica do Cristianismo. Esse aspecto religioso apresentou conceitos inovadores para a época e não demorou para que os sacerdotes evocassem o epíteto de agentes de Satanás para os espiritualistas. Essa reinterpretação da teologia cristã levou o jornal The New York Times, em edição de 12 de junho de 1852, numa atitude conservadora, a condenar o Espiritualismo Moderno por suas ideias subversivas sobre a devoção e a verdadeira fé. Esse mesmo artigo listava os “absurdos” princípios dessa nova doutrina.
Mesmo não sendo correta a alegação da inexistência de um aspecto filosófico para o Espiritualismo Moderno, a obra de Allan Kardec se desenvolveu sobre as condições empíricas desse movimento, conseguindo ao mesmo tempo incluí-la e superá-la epistemologicamente.